6/28/2010

caxinas setenta e sete (excerto)

(...)

imagina que as pessoas são
animais marinhos que aprenderam a
demorar ao sol

depois sente também o sol, percebe como
se pode mergulhar nessa luz, e depois imagina
que essa luz é a mesma do passado
e traz do passado todos quantos
se guardam na memória, e depois
percebe como a memória é a
presença de todo o tempo que já
foi, percebe que lembrar é um sol
que não tem dia e nem se apaga, percebe
que lembrar é a ressurreição de cada
um, percebe que lembrar é a verdadeira
história, e depois mergulha mais
fundo ainda na luz, talvez vejas um peixe
passar, estás a nadar, estás a nadar, és
também água, és um animal
marinho


Num poema que começa com as mesmas três estrofes deste excerto, fala-se da vida (grave) dos pescadores e das suas mulheres (imagina como naufragam na areia), e termina-se desta maneira, que para mim evoca o nosso passado evolutivo longíquo, a nossa memória genética de termos sido peixes.